sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Le Cordon Bleu – Terceira Semana!

Após 3 semanas de curso, é incrível como algumas coisas já entraram no automático. Por exemplo, todo santo dia de curso eu acordo às 6:45h, troco de roupa, coloco na bolsa o uniforme da cozinha, tomo café, preparo 2 sanduíches, escovo os dentes, penduro a sacola de livros nas costas, saio catando tudo que estou esquecendo e colocando na bolsa, penduro a bolsa no ombro esquerdo,  toolkit no ombro direito, ticket do ônibus no bolso esquerdo, iphone no bolso direito,  e lá vou eu que nem burro de carga para pegar o ônibus. Quer outro exemplo? Entre a aula de demonstração e a prática na cozinha, eu corro até o vestiário, deixo meus livros no locker, pego minha sacola de utensílios, como um sanduíche em 3 segundos, prendo meu cabelo, corro até a cozinha que fica do outro lado do prédio, coloco meu avental, prendo meus panos de prato no avental, e fico estudando a receita do dia até a hora que o chef nos chama para dentro. Dentro da cozinha eu deixo minhas tralhas no balcão, lavo as mãos, entro na fila para pegar a tábua de cortar e as vasilhas (mais tralha!), volto para a minha bancada, pego minha bandeja de ingredientes, separo os utensílios que vou precisar, e a partir daí são 3 horas e meia cortando, cozinhando, provando, se cortando, se queimando, e etc etc etc.

Outra coisa que entra no automático é o teamwork. Imprescindível na cozinha. Enquanto uns estão num esquema de competição, eu e Ismat (minha vizinha de bancada e um presente de amiga na minha vida) não fazemos nada sem pensar uma na outra. Se eu vou pegar farinha, pego para nós duas. Se ela vai checar a torta no forno, ela checa para nós duas. Ela não precisa pedir permissão para usar meus utensílios, nem eu os dela. Se ela está atrasada, eu a ajudo. Se estou fazendo algo errado, ela me avisa. No final, o resultado é bem superior ao que seria se fizéssemos cada uma por si. E aqueles que estão no esquema competição? À medida que as receitas complicam, é quase um suicídio tentar fazer tudo sozinho. Pelo andar da carruagem, não vai demorar muito até eles entenderem isso.

Ismat é minha maior parceira, mas não é a única. Eden, meu vizinho de frente, é o mais rápido de toda a cozinha. Enquanto eu pisco o olho, ele já cortou 3 cebolas, 5 cenouras e um saco de batatas. Com Eden não dá para fazer o mesmo esquema que faço com Ismat, porque ele está sempre um estágio à frente. O que acontece então? Toda aula prática, sem nenhuma exceção, Eden é o primeiro a acabar. O que ele faz? Não, ele não fica descansando, conversando, vendo celular, nada disso. Simplesmente Eden começa a limpar a sujeirada de todos. Sem ninguém nunca ter pedido isso a ele. Eu nunca consegui ajudar Eden (nem eu nem ninguém). E ele sempre, desde a primeira aula, me ajudou (não só a mim, mas a todos!). Eu acho isso simplesmente espetacular e tenho certeza que na hora de contratar, os restaurantes também acharão.

Semana a semana as receitas vêm ganhando técnica e complexidade.  Na segunda, preparamos Contrefilet de Bouef Rôti, ou simplesmente o nosso querido rosbife. Acompanhado de vagens francesas, cenouras e abobrinhas glacê e batatas chateau.

Preparado pelo chef John

Parece tranqüilo, só colocar a carne no forno e esperar. Será mesmo? Pra começar, você tem que limpar a carne, tirar toda aquela gordura dura e transparente que vira uma borracha quando cozida (não estamos falando aqui daquela gordurinha gostosa que dá sabor a carne). Limpou? Agora é hora de amarrar a carne com um barbante, para que ela não perca o formato quando cozinhar. E aí tem toda uma técnica, você segura o barbante aqui, roda acolá, dá três nozinhos de um lado, amarra do outro... Uma loucura. É claro que eu não consegui de primeira. Comecei de novo umas 5 vezes, e por último, tanto que fiz que a carne ficou bem amarrada, mas eu não conseguia dar o nó final. “Chef, por favor, não sei como dar o último nó de forma que o resto não se solte”. E a chef: “Nem eu! Nunca vi essa sua técnica. É nova?”. Pois é, inventei uma nova técnica de amarrar carne...rs. O resto é relativamente simples. Em resumo, é selar e colocar a carne numa panela com vinho tinto e caldo de carne, e deixar no forno, checando de vez em quando a temperatura  da carne com um termômetro.  Minha carne cozinhou direitinho. Meu problema foi o molho. Se lembra que na semana passada acabei reduzindo-o demais e ele virou um xarope? Nessa semana reduzi de menos e ficou igual água. Ai que pobreza... E o pior foi ter que apresentar o prato com aquela coisa rala e sem graça. Não fui embora para casa feliz esse dia.

Preparado por mim. Olha que desastre o molho...

Daí terça chegou, com um dos pratos que eu mais esperava: Carré d’agneau en persille com Ratatouille Provençale. Em outras palavras: Carré de cordeiro em crosta de salsinha com ratatouille (beringelas, abobrinhas, pimentões, tomates e cebolas em cubos) ao estilo provençal.

Preparado pelo chef John (o ratatouille está atrás do carré. 
Ao lado temos Pommes Anna, que ele preparou apenas como 
demonstração).

Minha carne preferida! Amo amo amo! Aprendemos a fazer no forno, com essa crosta de salsinha que é um arraso, e o ratatouille que ficou uma delícia! Meu carré ficou no ponto, (poderia ter ficado um pouquinho mais mal passado, mas tudo bem), o molho ficou na consistência certa, o ratatouille perfeito... mas claro, sempre tem algo para atrapalhar. Dessa vez foi a apresentação. “Ana, como é que você traz um prato assim para mim??????” “Me desculpe chef, derramei molho, tentei limpar, pelo jeito não consegui...” “Desta vez vou aceitar, mas na próxima você pega outro prato e monta de novo, entendido?” “Yes chef”.

Preparado por mim. Dá pra ver a bagunça do prato?

Então chegou quarta. E o desafio? Clafoutis aux cerises com Sauce Anglaise (torta de cerejas com creme Anglaise).

Preparado pela chef Elke

Esta é uma receita que exige muita atenção e cuidado com os detalhes. Tudo pode dar errado.  Para começar a massa, dificílima de manusear, dificílima de chegar no ponto, dificílima de colocar na forma...  Teve gente que empacou ai e não saiu mais. Eu quase empaquei. Primeiro porque coloquei dois ovos em vez de um (Ismat e Eden, ao mesmo tempo, me alertaram do erro!). Chamei o chef e ele conseguiu tirar um ovo sem quebrar a gema (isso só com experiência!), mas acho que deixei um pouco de clara desse segundo ovo lá. O resultado é que a minha massa ficou mais molhada que o normal. O que se faz numa hora dessas? Mais farinha. Mas só fui entender isso depois de passar 15 minutos me estressando com aquele grude na minha mão. Depois, na hora de colocar na forma, a danada quebrou, e tive que abrir ela de novo. Deu certo,fui de segunda, mas me atrasei. E aí começou a bater aquele desespero: “não vai dar tempo, não vai dar tempo”. Até que olhei para o lado, e percebi que, com exceção do Eden e da Ismat, todos estavam tão ou mais atrasados que eu! Até a galerinha da competição estava muito atrás, uns ainda brigando com a massa, outros tendo que fazer tudo de novo. No final é claro que deu tempo, até sobrou. Torta no forno, tudo arrumado e limpo, e pela primeira vez em 3 semanas me vi sem ter o que fazer. Então a cabeça começa a funcionar, e “Chef, o pedaço da torta no prato, precisa ser triangular?” O chef me olhou desconfiado, e disse: “Não necessariamente”. “Thanks chef”. E com um sentimento incrível de liberdade criei uma apresentação completamente diferente das demais. E ainda acrescentei uma canelinha com açúcar que foi muito bem com as cerejas. Só esqueci de tirar a foto! Hahaha! Mas quando cheguei em casa, tentei repetir, e eis ai mais ou menos como ficou. Sendo que na aula eu coloquei um “caminho” de canela em pó em cima do açúcar.

Preparado por mim, mais ou menos igual ao que fiz na aula. 
Ficou faltando o caminho de canela em cima do açucar.

Na saída da cozinha, chef de bobeira, não agüentei e perguntei: “Chef, gostou da decoração?”. “Yes, yes, very creative”. “Thanks chef!” Aêêêêêêê!!!!!!!!!!!!!!!

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