quarta-feira, 7 de março de 2012

Le Cordon Bleu - Quinta Semana!

Outro dia estávamos tendo uma aula sobre segurança na cozinha. Acredite ou não, cozinhar é quase como ir para a guerra. A começar pelo uniforme, completamente projetado para minimizar os acidentes, que não são poucos. Isso me fez lembrar uma vez que eu estava cozinhando macarrão em casa e, quando fui escorrer a água, a panela escorregou da minha mão e a água fervendo foi toda na minha perna. E aí você pensa que eu tenho a perna toda queimada por causa disso? Na verdade não. E não foi um milagre. Por sorte no dia eu estava vestindo calça jeans, e o tecido segurou todo o calor da água. Ardeu um pouco, mas não chegou a queimar.

Esta é a razão porque usamos calças compridas na cozinha. E não basta ser comprida, tem que ser larga, para que a água ou o óleo fervendo que foi absorvido pelo tecido não entre em contato com a pele. Seguindo na mesma linha, é por esta razão também que usamos mangas compridas (tudo bem que muitas vezes a cozinha está um inferno, e o que acontece de fato é que dobramos as mangas e só as desdobramos quando sentimos que há algum perigo). Além das mangas compridas, a jaqueta é transpassada na região do peito e do abdômen, para proteger a área. O avental, além de não deixar sujar a roupa, também tem a função de proteção. Os sapatos, de solado emborrachado, evitam escorregões. E por último, a gravata, que eu jurava que era apenas decoração, também tem a função de torniquete no caso de algum acidente mais grave com as facas.

E porque eu estou falando disso hoje? Porque essa semana a gente usou muito o deep fryer (se lembra onde eles fritam as batatas do McDonalds? Isso mesmo, aquela “pia” cheia de óleo fervendo se chama deep fryer). A 180°C, o deep fryer frita até a sua sombra, se você bobear. Quem dirá então um dedinho desavisado? Sem contar com os respingos. Na correria da cozinha, ogra que sou, não quis perder tempo colocando “delicadamente” meus goujons no deep fryer. Resultado? Respingo de óleo quente para todos os lados, e mais algumas queimaduras para a coleção. Se não fossem as mangas compridas e a calça grossa e larga, a coisa tinha ficado feia...

A semana 5 foi toda dedicada ao mar. E segunda foi dia de peixinho. Ou melhor, peixão! Olha só que beleza:

Truite au Bleu preparada por Chef John

O amigo aí no prato parece simples, não? Mas é complicado, como qualquer receita francesa. O peixe é cozido em caldo de peixe com cenoura, cebola, vinagre, pimenta do reino, louro e salsinha. Sabe esse formato que ele está no prato? Não, ele não vem assim da peixaria (era só o que faltava, peixe corcunda!). Para ele ficar neste shape, a gente amarra a ponta de um barbante na boca do peixe, a outra ponta no rabo, e puxa. Daí o peixe é cozido assim. Quando está pronto, a gente tira o barbante, e ele fica tortinho e bonitinho.

Truite au Bleu preparada por mim!

O peixe em si não é assim tão complicado. O que complica mesmo é o molho, Sauce Hollandaise (só de escrever aqui eu já me arrepio toda). Eu já tinha tentado a receita há uns 3 anos, e deu muito errado (eu não cheguei nem perto do que deveria ser!). Entrei na cozinha morrendo de medo do danado do molho. E tive que fazer duas vezes, porque na primeira talhou (é nessas horas que a gente xinga em português e todos os outros alunos ficam olhando com cara de “oi?”). No final saiu o molho, mas acabei colocando muito vinagre e ficou horrível. Tive que apresentar assim mesmo para o chef, não dava mais tempo... Mas não me dei por vencida. Chegou final de semana, e eu pensei: “é hoje que eu te pego”. Então fui no supermercado, comprei os ingredientes para um belo Eggs Benedict (para quem não sabe, é um prato de café da manhã, que leva muffin inglês, presunto ou bacon, ovo pochê e claro, sauce hollandaise), e fui para a guerra. O resultado? Um lindo, delicioso e perfeito molho hollandaise, pela primeira vez na vida! Que orgulho!!!!

Ai que delícia!!! (isso aí embaixo das folhas de baby 
espinafre não é geléia não... kkkk... é azeite de oliva!)

Voltando para as aulas, na segunda também foi dia de Filet de Saint Pierre a La Munière. Basicamente, peixe empanado e frito com molho de manteiga e salsinha. Perfeito para comer na praia tomando uma cervejinha...

Preparado por Chef John

 Preparado por mim

Aliás, tudo que fizemos esta semana cai muito bem com uma Skol gelada (ai que saudade do meu Rio!). Especialmente esse aí embaixo que fizemos na terça:

Goujons de Poisson Frits com Sauce Rémoulade preparado 
por Chef John
Preparado por mim

Na terça também fizemos Supreme de Saumon à L’oseille. O molho é praticamente manteiga, creme (olha a duplinha aí de novo!) e sorrel (uma verdura azedinha que eu ainda não consegui descobrir a tradução para o português).

Preparado por Chef John

Ficou uma delícia, mas eu achei muito pesado. Veja só, salmão já é um peixe gorduroso. Daí o molho é pura manteiga com creme. Por último a gente ainda tinha que passar as batatas cozidas na manteiga para ganhar brilho! Não fiz, fui rebelde e deixei minhas batatas cozidas e saudáveis sem manteiga. James, um vizinho de bancada inglês ainda me alertou da falha, e eu disse “Thanks man, but I’m not doing this. Se eu tenho um restaurante, meu cliente morre do coração depois do jantar!”.

Preparado por mim, sem manteiga na batata (rebeldia!)

Não deu outra, fui apresentar o prato para chef Josef, e a primeira coisa que ele disse: “Ana, cadê a manteiga nas batatas?”. Não pestanejei, e com todo o meu jeitinho carioca, disse: “Sim chef, eu não esqueci. Apenas não quis colocar mais gordura num prato já tão gorduroso. Sabe como é, hoje em dia temos que nos preocupar com a saúde de nossos clientes”. E ainda dei uma piscada de olho do tipo “morô?”. Ele riu e disse “ok, eu não vou levar este erro em consideração”. Terminados os trabalhos, saindo da cozinha, ainda tive que escutar de chef Josef um “bye bye chef Ana, you’re funny!”. “Yes chef! Hahahaha”.

Na quarta, dois pratos com frutos de mar que ficaram uma delícia! Crevettes sauttés avec legumes et tofu (camarões salteados com legumes e tofu) e Calmar au sel et poivre (lulas fritas com sal e pimenta).

Crevettes sauttés avec legumes et tofu preparado 
por Chef Elke

Calmar au sel et poivre preparado por Chef Elke

Meus camarões estavam perfeitos (beutifully cooked, segundo chef Tristen), mas acabei colocando muita cenoura e muito gengibre.

(na correria de servir o prato, esqueci a foto de novo... que raiva! E tinha ficado linda a decoração! Uma pena...)

As lulas eram empanadas. Ok, para empanar você tem que passar na clara de ovo antes, para que a farinha grude bem. Adivinhem? Esqueci de passar nas claras, fui para a farinha direto, e só percebi o erro quando as lulinhas já estavam no deep fryer. Pensei: “ferrou mané!”. Daí quando olhei para o lado, as lulas de Ismat estavam exatamente iguais as minhas! Perguntei para ela “Girl, você lembrou de passar as lulas nas claras?”, e ela, com cara de horror “Oh my gosh, esqueci!”.  Hahahaha, enfim, lá foi Ismat apresentar o prato dela. E enquanto eu estava montando o meu, lá veio Ismat de volta, com um sorrisinho escondido. Então baixinho ela me disse “O chef nem percebeu... hehe”. Que beleza! Fui apresentar o meu e a mesma coisa, ele nem percebeu! Conclusão: a clara não faz a menor diferença, e só está lá para complicar a receita. Ah seus franceses abusados!

Calmar au sel et poivre preparado por mim

Fechada a semana, depois de tanto peixe, começou a me dar uma crise de abstinência de carne... Então passei no mercado, comprei uns New York steaks, e fiz um belo bife acebolado! Acompanhado de pommes chateau, só para praticar (afinal está chegando o dia da prova prática!!!).

Bon Appetit!