sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Le Cordon Bleu – Segunda Semana!

Primeiramente, gostaria de dizer que sim, ainda tenho os 10 dedos! Mas verdade seja dita, minhas mãos continuam sofrendo. Saíram os cortes, entraram as queimaduras. E que festival de queimaduras! Não se salvou um dedo sequer.  Esta semana nós usamos muito o forno, todos os dias, e a cozinha virou uma sinfonia de “ai!”, “ui!”, e de vez em quando um “aaaaaaaaaaaaaaaiiii!!!!!!!!!”. No final do terceiro dia, ninguém mais ligava se estava queimando ou não, as mãos já estavam dormentes mesmo, a pele já estava toda esturricada, a bolhas já tinham virado calos... e adeus às mãos de princesa, acho que nunca mais as terei.

Outra dificuldade da semana foi chegar ao curso. Perder o ônibus virou rotina. E aí você pensa: “isso que dá dormir demais e chegar atrasada no ponto! Bem feito!”. Obrigada pela parte que me toca, mas não foi o caso. Eu cheguei adiantada no ponto todos os dias. O problema é que o transporte público aqui na Austrália funciona muito bem. Tão bem, que ao invés do ônibus chegar atrasado, ele chega adiantado! No primeiro dia, cheguei 3 min mais cedo no ponto, e quando olho para a esquerda, olha o ônibus lá!!! Tá vindo? Não, tá indo! Já passou... Daí no segundo dia, cheguei 8 min mais cedo, e “Vale a pena ver de novo” entrou no ar, exatamente a mesmíssima cena, com direito a ônibus indo embora em câmera lenta e piiiiiiiiiiiiiii saindo da minha boca enquanto eu corro desnecessariamente na esperança ridícula que o ônibus vai parar e me esperar. Então no terceiro dia, com muita raiva no coração, eu pensei: “hoje vou acabar contigo seu desgraçado!”. E foram 10 minutos mais cedo no ponto. Cheguei lá, apoiei meus 20 quilos de tralha no chão, cruzei os braços, angulei as sombracelhas, e fiquei lá, batento pezinho... e bati pezinho, e bati pezinho, e fiquei a bater pezinho por exatos... 10 minutos! Sim, dessa vez ele chegou na hora. Tenho certeza que escutei o pensamento do motorista: Gotcha!  Ok, 3 x 0, mas eu juro que vai ter revanche.

Fora as pedras no caminho, a semana foi excelente. E eu já estou preparando pratos que até minha mãe duvidaria. Tudo bem que nem tudo saiu perfeito, mas não se esqueça que eu ainda estou aprendendo. E que eu entendo mais ou menos 80% do que o chef diz (60%, se o chef for italiano, e 40% se o chef for australiano, eita sotaque difícil!). Ou seja, algumas vezes eu simplesmente não sei o que deve ser feito. Quando consigo perguntar de novo ao chef, ótimo, mas quando não consigo, o que faço é olhar para os outros alunos, descaradamente, e copiar o que eles estão fazendo. E claro, torcer para que eles estejam fazendo certo.

Na segunda-feira, primeira aula da semana, nossa meta era preparar uma quiche Lorraine. Então primeiro a gente faz a massa, deixa a massa descansar e enquanto isso prepara os outros ingredientes (bacon e queijo). Depois a gente assa a massa sem o recheio, prepara o recheio, coloca o recheio, assa mais um pouco, e pronto, temos uma linda quiche Lorraine. Parece fácil né? Mas não é. Foram 3 horas e meia numa confusão total, 3.574 detalhes para prestar atenção e o fogão, de pirraça, resolveu não esquentar muito (será que ele ficou com pena das minhas mãos? Obrigada pela preocupação, querido fogão. Mas eu preciso que você esquente, mon amour). Ou seja, na hora de apresentar à chef, a massa estava ainda um pouco crua. O que me salvou, de novo, foi o tempero, na medida certa, excelente segundo a chef. Aeeeee!

Daí na terça, a coisa complicou mais. Além de termos que preparar e assar uma Pissaladiére (pizza francesa em formato retangular, sem queijo, e com minhas muito amadas anchovas!), tivemos também que preparar o super chique Pouding de riz à La Française (primo rico do nosso arroz-doce, de festa junina).  E pela primeira vez no curso eu tive vontade de chorar. Não porque cortei ou queimei a mão (meu lado macho não me deixa chorar por essas coisas), mas porque me vi completamente perdida umas 10 vezes. Sabe quando você vai até o outro lado da cozinha, e quando chega lá, pensa: “mas o que eu vim fazer aqui mesmo?”. E não, eu não dormi na aula de demonstração, muito pelo contrário, acompanhei e anotei passo a passo. Mas às vezes a gente está num dia ruim mesmo. O fato é que esqueci de botar o sal e o açúcar na massa da Pissaladiére, e o leite do pudim quase me matou do coração quando levantou fervura e por pouco, muito pouco mesmo, não entorna no fogão inteiro. Pelo menos meus reflexos estão em dia. Em 1 segundo a panela do leite já estava em cima da pia, meu rosto virado para o lado – sem coragem para ver a cena - e eu pensando: “Vai, derrama seu desgraçado!”. Não derramou! Chegou na bordinha e não derramou! - meus agradecimentos ao santo dos cozinheiros avoados. No final de tudo, para minha grande surpresa, a massa da Pissaladiére ficou ótima, e o pudim não ficou assim dos melhores, mas passou na média. Um milagre, levando em consideração as 3 horas e meia de horror.

Então chegava quarta-feira, e eu sinceramente entrei em desespero. O menu? Pernas de carneiro ao molho de vinho tinto, risotto, vagens francesas e cenouras glacê (em formato de barril!!!). “Não, não vai dar tempo, não é possível, assim não dá. Ei Cordon Bleu, eu ainda tô na segunda semana do básico hein! Vocês tem certeza disso????” Foi o que pensei quando cheguei em casa na terça e fui estudar para o dia seguinte. Bom, eu não tinha outra escolha a não ser tentar me preparar ao máximo. E assim fiz. Estudei cada ingrediente, suas quantidades, o que fazer com cada um, quando fazer, que utensílios usar, e etc etc etc. No dia seguinte, na aula de demonstração, eu não pisquei o olho, eu não olhei para os lados, eu não deixei de prestar atenção 1 segundo sequer. Eu era uma máquina. Resultado: quando cheguei na cozinha, sabia exatamente o que fazer, não perdi um milésimo de segundo, minha mente era um workflow, e enquanto eu estava no passo 3, ela já planejava os passos 4, 5 e 6. Pela primeira vez, me senti uma profissional na cozinha. O resultado dos pratos? Não, nem foi dos melhores. O risotto estava com boa consistência, mas faltou sal (se bem que o chef falou isso para a turma inteira, então acho que é ele que gosta de sal demais). O carneiro podia ter cozinhado mais (mas quando tirei do forno, pedi ao chef para ver se estava cozido, e ele disse que sim! Enfim, na próxima vez levarei em consideração também a minha opinião). E o molho? Tínhamos que reduzir (significa deixar em fogo baixo para que a água evapore e o molho ganhe consistência). Eu juro que entendi que quanto mais reduzido, melhor. Então deixei uns 40 min em fogo baixo e o molho virou um xarope. Achei lindo, achei que estava perfeito, achei que estava arrasando, e quando mostrei ao chef, surpresinha: reduziu demais. Para completar, minhas vagens estavam muito cozidas (elas tem que ficar al dente). Pelo menos as cenouras estavam perfeitas. Mas quem quer saber delas?

Enfim, apesar do resultado ruim, eu fui feliz para a casa. Consegui me organizar na cozinha, manter a calma, pensar em etapas, e não entrar em desespero. Para mim foi um passo enorme! Totalmente necessário para que eu ganhasse confiança novamente e continuasse acreditando que estou no caminho certo. A realidade é que pela primeira vez na minha vida eu realmente AMO o que estou estudando. Não me importo de perder as noites e finais de semana lendo sobre o assunto e praticando. Porque para mim não é estudo, é diversão, é felicidade, é bom demais.

Para as próximas semanas, prometo que me lembrarei de tirar fotos dos pratos. Mas se um deles queimar, vou falar que esqueci, e vocês devem fingir que acreditam, combinado? J

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