Eu poderia dizer que estou sem tempo, mas seria mentira. Sim, tempo é a gente que faz. Temos tempo para aquilo que priorizamos, para o que é imprescindível e para o que nos faz feliz. E antes que você pense que escrever aqui não me agrada, eu já digo: amo escrever, e sim, me faz falta compartilhar neste blog minhas aventuras. O problema é que com tanto acontecendo, o tempo foi sendo alocado para outras coisas que me fazem feliz também, e o blog acabou um pouco esquecidinho. E dessa vez não vou prometer escrever uma vez por semana, escrever sobre isso ou aquilo, escrever sempre que tenho tempo (essa desculpa não cola mais!)... Vou escrever quando eu achar que devo, por prazer, porque me faz feliz. Acho que é uma boa resolução, pelo menos para mim :)
Mas o que anda de bom acontecendo Carol? (Ou Ana, como me chamam aqui... enfim, tenho dois nomes, use o que preferir). Em primeiro lugar, e pela primeira vez na história desse país chamado EU, estou amando aquilo que os outros chamam de profissão, mas que para mim é a mais pura diversão. Virei cozinheira, visto jaqueta e chapeu de chef todos os dias, meu sapato é preto e de borracha, meus dedos estão todos cortados e queimados e minha barriga esquenta todos os dias no fogão. Sim, cozinheira. Entro no trabalho 1 da tarde, chego pelo menos meia hora antes todos os dias, visto meu uniforme, bato ponto, coloco o avental, penduro dois panos de prato na cintura, organizo minha bancada de trabalho, estudo o que tenho que preparar para o serviço. Sim, cozinheira. Janto as 5, enlouqueço as 8, limpo tudo as 11, chego em casa meia noite, vou dormir 1 da manha. 5 dias na semana. São pelo menos 10 horas seguidas em pé, sem parar, sem espirrar, sem ir ao banheiro, sem frescurite de mulher, sem ter o direito da coluna doer, da tendinite piorar, da cabeça se desviar em outros assuntos. Sim, cozinheira. E não consigo me imaginar fazendo nenhuma outra coisa a não ser isso.
Isso tudo é tão surreal que às vezes, quando o restaurante está mais calmo, me "acho" no meio da cozinha, no meio de outros tantos iguais a mim, gente da Indonésia, da Tailândia, da Korea (não podia faltar!), da Inglaterra, da Itália, da Austrália (pasmem!), gente que escolheu cozinhar como profissão porque ama preparar e servir comida. Me vejo no meio disso tudo e a vontade é de me beliscar para ver se não é sonho. Penso que há um ano, só um ano atrás eu não poderia, de forma alguma, prever nem um décimo do que está acontecendo. E muitas vezes me bate um medo inexplicável que vem lá de dentro e me apavora. Medo do desconhecido, de tudo que ainda está por vir, do que ainda não consigo prever mas que hoje sei que é possível, tudo é possível.
Muito ainda vai acontecer, eu sei. Mas não aguento de ansiedade. Quero mais, cada vez mais. Quer ler, quero aprender, quero assistir, quero conhecer, quero experimentar, quero. E quanto mais quero, mais eu amo, mais eu desejo, mais eu anseio por essa vida que me esperou 28 anos.
Enfim, para finalizar pois o sono finalmente está batendo, sei que o blog era para contar sobre minha viagem pela Austrália (cangurus) e Ásia (budas), e agora o nome ficou meio sem propósito. Mas vou manter. E quem disse que o nome tem que fazer sentido? Fez sentido quando criei, vai ficar do jeito que está. E como quase tudo na minha vida, quem sabe não fará sentido no futuro? Veremos :)
domingo, 4 de novembro de 2012
domingo, 13 de maio de 2012
Um pouquinho de técnica vai bem: Crème Pâtissière e "Blind Baking"
Você entra em qualquer
Pâtisserie francesa e lá estão elas, as lindas tartelletes. É de comer com os
olhos. Não há como não ficar pelo menos uns 10 segundos hipnotizado com tamanha
belezura numa coisinha tão pequenininha. Daí você compra. E em 3 mordidas a tartellete
foi embora. Fica aquele gostinho de quero mais, não fica?
Pois é, porque não
fazer em casa então uma big tortellete? Ou no meu melhor francês, uma Tart?
Tart aux fraises glacé avec sauce abricot á la confiture
Não, não fique tímido/a, é facinho
facinho. Tudo o que você precisa é de um pouquinho de técnica e uma boa receita
de Crème Pâtissière. E nisso eu posso te ajudar! E antes que você me pergunte “Mas
o que é Crème Pâtissière tia???” eu explico que é aquele recheio cremoso lindo
de lamber os beiços que vem dentro da tartellete. Ele é a parte crucial da
receita, e se não for feito da maneira certa, vira um desastre. Então pare de
desenhar no caderno e preste atenção na aula, que eu te dou uma estrelinha no
teste J
Para começar, você vai
preparar a massa da torta, vai deixar ela descansar e depois vai cozinhá-la sem
nenhum recheio. Então misture 100g de manteiga sem sal, 75g de açúcar e 230g de
farinha comum (sem fermento) até virar uma pasta homogênea. Adicione 1 ovo e
raspas da casca de uma laranja. Misture bem até formar a massa. Se a massa
estiver molhada demais (o que pode acontecer se você colocar um ovo muito
grande) e só adicionar mais farinha. Daí é só cobrir com filme PVC e deixar
descansar na geladeira por pelo menos 20 minutos.
Passaram os vinte
minutos? Agora é só abrir a massa (sabe aquele rolo que está esquecido na sua
cozinha? Pois é, ele não serve apenas para fazer massagem nas costas!) com
calma e cuidado até atingir de 1 a 1,5mm de espessura. Lembrando: para fazer
isso de forma segura, abra a massa numa superfície limpa, seca, e com farinha.
É bom passar farinha no rolo também. Abriu a massa? Unte uma forma de torta com
manteiga e com a ajuda do rolo, coloque a massa em cima da forma. O vídeo
abaixo explica bem como é este processo se você nunca fez isso na vida.
Deixe a massa
descansar mais uns 5 minutinhos na geladeira (só para dar aquela esfriada) e
asse ela sem recheio (blind baking) a 180°C por pelo menos 30 minutos, ou até
a massa estar completamente pronta para consumo. Segunda pausa: Não vá
colocando a massa assim no forno sem nada em cima, por favor! Se você fizer
assim, a massa não terá nada que a impeça de crescer, e isto significa menos
espaço para o seu recheio. “Ah, mas não estou entendendo nada! É para assar a
massa com recheio ou sem recheio?”. Com e sem. Calma que eu explico. Você vai
enganar a massa colocando algo que não é o verdadeiro recheio, mas que vai
fazer bem a função dele. Para isso você precisa de papel manteiga e... moedas!
Geralmente a gente usa arroz ou feijão cru, mas as moedas “enganam” melhor a
massa porque transferem melhor o calor. Não entendeu como se faz? Então dá uma
olhada no vídeo abaixo:
Enquanto a massa está
no forno, vamos finalmente preparar o Crème Pâtissière. Para tanto você vai
precisar de 500ml de leite (de preferência integral), 3 gotas de extrato de
baunilha (não é essência não viu? Deixa de ser pão duro!), 5 gemas de ovo (na
verdade a receita diz 100g de gema, o que equivale a mais ou menos 5 gemas),
100g de açúcar, 65g de amido de milho (famosa Maisena) e 35g de manteiga.
Aqueça o leite com a essência de baunilha até levantar fervura. Enquanto o
leite está aquecendo, misture as gemas de ovo com o açúcar e bata até a mistura
ficar com um amarelo mais pálido. Adicione o amido de milho e misture bem até
ficar homogêneo. Acrescente o leite quente (mas não fervendo, deixe esfriar por
1 minutinho), misture, e cozinhe em fogo baixo, mexendo loucamente (de
preferência com um batedor de ovos) até o creme ganhar uma consistência bem
firme. Cubra com filme PVC a superfície do creme (ele resseca e muda de cor se
ficar em contato com o ar) e deixe na geladeira até resfriar.
Quando a massa estiver
completamente assada, leve ela a geladeira também. É muito importante que todos
os componentes da torta estejam frios na hora de montá-la. Para montá-la,
preencha a torta com o Crème Pâtissière, ajeite os morangos em cima (ou amoras,
framboesas, pêssegos, kiwis, o que estiver na estação) e pincele geleia por
cima para dar o brilho (no caso da geleia, aqueça com um pouco de água e passe
numa peneira. Assim você terá um líquido mais homogêneo para o toque final da
sua torta).
A Tart está pronta para servir! Merveilleux!
sábado, 12 de maio de 2012
Na cozinha de casa: Risotto de linguiça com cogumelos
Após 11 semanas de Le
Cordon Bleu (9 no básico e 2 no intermediário) eu posso dizer, muito confiante,
que já consigo me virar bem na cozinha. Pera lá, não vem dizer que não estou
sendo humilde porque eu poderia estar dizendo que já me sinto chef! De fato,
minha modéstia não permite tal comparação. Mas tenho que confessar: de vez em
quando me baixa um espírito de chef aqui em casa e eu me sinto a própria
Nigella Lawson, abrindo a geladeira loucamente e buscando duas ou três
gostosuras que juntas vão fazer uma gostosura melhor ainda.
Hoje a tarde aconteceu
de novo. Tudo bem, muito influenciado pela lingüiça que comprei ontem no Victor Churchill. Comprei duas, e uma já foi no mesmo dia no meu brunch delicioso de lingüiça,
cebolas, tomate e ovos. Havia sobrado uma para hoje e eu não sabia muito o que
fazer com ela. Não queria apenas fritar e comer como aperitivo. Queria fazer
algo diferente. Daí abri a despensa e o que achei? Arroz arbório. Dei uma
bisoiada na geladeira e opa... cogumelos! Pronto! Risotto de lingüiça com
cogumentos seria o menu du jour! Mãos a obra, faca na cebola, barriga no fogão
e 40 minutos depois, olha que beleza!
Segue abaixo a
receita. Muito fácil de fazer, mas tem que prestar atenção na técnica do
risotto, se não vira uma maçaroca grudenta que ninguém merece!
Ingredientes:
200g de arroz arbório
1 litro de caldo de
carne
1 cebola pequena, bem
picadinha
1 a 2 linguiças de
porco (dependendo do tamanho)
100g de cogumelos
Paris (champignon in natura), fatiado
30 ml de vinho tinto
60g de manteiga
Sal a gosto
Pimenta do reino a
gosto
Modo de Preparo:
Corte a linguiça em
fatias finas e frite sem óleo até os pedaços ficarem bem dourados. Adicione os
cogumelos, deixe cozinhar por mais uns 5 minutos até os cogumelos ficarem
macios, porém ainda firmes. Reserve. Na mesma frigideira, adicione 30g de
manteiga e a cebola picada. Frite a cebola até ela ficar transparente. Adicione
o vinho tinto e reduza até que o álcool tenha evaporado. Acrescente o arroz e
deixe cozinhar, mexendo sempre para não queimar, até o arroz ganhar uma cor
mais amarelada (isso leva uns 5 minutos mais ou menos). Comece a acrescentar o
caldo de carne bem aos pouquinhos, UMA CONCHA POR VEZ, sempre após o arroz já
ter incorporado todo o caldo da concha anterior. Vá fazendo isso até que o
arroz esteja macio, porém ainda firme (al dente). Desligue o fogo, acrescente
30g de manteiga e mexa de forma que o risotto incorpore a manteiga. Por último,
misture a linguiça e os cogumelos fritos, e sirva imediatamente.
sexta-feira, 11 de maio de 2012
Victor Churchill – Açougue para boi nenhum botar defeito!
Eu nunca vi nada igual. É um
açougue, mas você só percebe isso depois que entra. E mesmo assim, demora um
tempo para perceber. A decoração é de restaurante 3 estrelas Michellin. As
carnes, perfeitas, são dispostas em vitrines como se fossem joias. O
açougueiro, atração principal, tem seu destaque garantido num aquário de vidro
com direito a jogo de luzes e (pasmem!) gravata! E os preços, obviamente são
muito salgados, mas olhar não tira pedaço. Para os amantes de uma boa carne, ou
de gastronomia em geral, vale MUITO a pena a visita.
Não resisti e tive que sair levando alguma coisa. Mas queria experimentar algo diferente. Então optei pela linguiça de
porco com cidra de maçã. Comprei duas. E uma já foi na hora do almoço. Olha que
beleza:
Lingüiça de porco com cidra de maça,
cebola, tomate e ovos. É só fritar a lingüiça, adicionar a cebola e o tomate, temperar
com sal e pimenta do reino, dar mais uma fritadinha, desligar o fogo, acrescentar
os ovos e deixar no forno até o ovo cozinhar. É para comer na frigideira mesmo,
pois é lá que está uma boa parte do sabor da lingüiça. Muito fácil de fazer, e
é sucesso garantido para o seu café da manhã ou brunch.
O Victor Churchill fica na 132 Queen Street,
Woollahra. Eles também oferecem uma série de cursos como
por exemplo, como fazer linguiças gourmet em casa. Se quiser saber mais sobre
os cursos, dá uma espiada no http://www.victorchurchill.com.
Um pouquinho de técnica vai bem: o bom bife
Parece simples. Quase todo mundo já
fez pelo menos uma vez na vida. Mas para fritar um bom bife é preciso prestar
atenção em algumas regras básicas. E sim, existe técnica para conseguir o bife
perfeito! É só seguir as dicas abaixo:
1) A escolha da carne: A carne tem que ser de
primeira, se não fica difícil. Eu pessoalmente gosto mais do contra-filé,
principalmente o corte do meio, de onde a gente tira os
maravilhosos bifes de chorizo. Eles são meus favoritos por causa altura e da capa de
gordura que deixa tudo mais gostoso.
2) O tempero: Nem pense em tacar sal na carne horas
antes de fritar o seu bifinho para deixa-lo mais "saboroso"! O sal
neste caso é um inimigo, pois ele irá "puxar" toda a umidade da
carne. Resultado? Carne dura! Então, antes de fritar, tempere com azeite de
oliva e pimenta do reino. O azeite, além de dar sabor, ajuda na hora de fritar.
E quando você pode colocar o sal? Apenas no momento que for fritar. Eu só
coloco sal com o bife já na frigideira.
3) O equipamento: Frigideira ou grill, tanto faz,
desde que o mesmo esteja MUITO quente. Não se desespere, não vai queimar
instantaneamente (é aqui que entra a ajuda do azeite). Quanto mais quente
melhor. Por que? Porque o bife tem que ser selado de forma que perca a menor
quantidade de líquido possível, ou seja, de forma rápida. Eu deixo a frigideira
no fogo, sem nada, apenas esquentando, por pelo menos uns 5 minutos antes de
colocar o primeiro bife. Mas é claro, tem que ficar de olho, se não o bife
queima.
4) O procedimento: Com a frigideira bem quente, você
coloca o seu bifinho (que está coberto com uma linda camada de azeite, ou seja,
não precisa mais colocar nenhum óleo) e deixa fritar até a carne ganhar aquela
cor dourada. Vire o bife e deixe acontecer a mesma coisa do outro lado.
Parabéns! Você acabou de fazer um bife mal-passado. Ah, não gosta assim? É só
deixar mais tempo. Mas aí acontece que você deixa mais tempo e a carne acaba
queimando... Para evitar isso, deixe o forno já pré-aquecido e quando você
perceber que vai queimar, é só colocar a frigideira dentro do forno! A carne
vai continuar cozinhando, sem o perigo de virar carvão por fora e carpaccio por
dentro.
5) O ponto da carne: É aqui que se diferenciam os
cozinheiros de final de semana dos verdadeiros chefs. Como verificar o ponto da
carne? Não, nem pense em cortá-la ao meio! Existem 2 maneiras bem mais
elegantes:
a) Temperatura: Se o bife
é grosso, e você tem um termômetro em casa (de cozinha, por favor, nada de
medir a temperatura da carne com o mesmo termômetro de checar febre!), pela
temperatura da parte central do bife você vê se a carne está no ponto ou não. Até
55°C a carne está mal passada. De 55°C a 60°C, ao ponto para mal. De 60°C a 65°C,
ao ponto. De 65°C a 70°C, ao ponto para bem. E a partir de 70°C, bem passada (se
o termômetro marcar 100°C, pode ter certeza, a sua carne está queimada!).
Repetindo, este método só é eficaz se o bife for grosso. Porque com um bife
fino, é quase impossível encontrar o ponto central da carne, e obviamente as extremidades
estarão muito mais quentes, o que lhe levará ao erro.
b) Firmeza: aqui a regra é
simples. Quanto mais macia, mais mal passada. Quanto mais firme, mais bem
passada. E como se mede isso? Com o dedão mesmo! (mas nada de colocar o dedão
na boca depois hein)
Deu água na boca? Então siga até o
próximo açougue, compre uns bons bifes de chorizo (hummmm) e mãos a obra! Ou
melhor, a frigideira! Quer impressionar? Eu ajudo. Abaixo segue a receita da
chique e famosa manteiga Maître d’Hotel, que nada mais é que uma manteiga com
ervas e limão, mas que faz uma presença incrível! Ainda mais se você
apresentá-la com este nome. A ideia é colocar fatias bem finas da manteiga em
cima do bife, e deixá-lo mais 5 minutinhos no forno até a manteiga dar aquela
derretida de leve. O resultado é este aqui! Bon appetit ;)
Manteiga Maître d’Hotel
Ingredientes:
100g manteiga com sal
¼ de maço de cerefólio (se não
encontrar cerefólio não tem problema, não vai fazer assim tanta diferença)
¼ de maço de estragão
¼ de maço de salsa (do tipo
continental, ou seja, com as folhas grandes e retas)
¼ de limão (apenas o suco)
Pimenta do reino moída a gosto
Modo de preparo: Pique todas as
ervas bem picadinho. Aqueça a manteiga em banho maria ou no micro-ondas, até
que seja possível manipulá-la com a espátula de forma que ela fique na
consistência de pasta. Misture as ervas na manteiga, adicione o suco de limão e
a pimenta do reino moída. Transfira a mistura para qualquer superfície com
filme PVC. Daí é só enrolar a manteiga no filme, colocar no formato que você
desejar, e deixar na geladeira por pelo menos 1 hora até que ela endureça
novamente.
sábado, 5 de maio de 2012
E os planos mudaram!!!
Se você faz parte do meu dia-a-dia, você já sabe que, para não perder o costume, eu mudei todos os planos! E estou pensando seriamente em mudar também o nome deste blog, que não condiz mais com a minha aventura neste outro lado do mundo. Confundiu? Eu explico.
Há uns bons 4 meses atrás, quando criei este blog, o plano era fazer o curso básico de cuisine do Le Cordon Bleu, e depois viajar por 3 meses conhecendo toda a Ásia (tudo bem, toda não, impossível, mas enfim... você entendeu!). Daí eu vim para a Austrália, o curso começou, e já no primeiro dia eu senti que eu não ia conseguir largar mais isso (você se lembra deste post?). Então eu me informei daqui, pesquisei dali, pensei 3.427 vezes sobre o assunto, conversei com minha mãe (não pode faltar!) e decidi que o que eu quero mesmo é colocar o chapelão na cabeça, queimar a barriga no fogão e fazer a alegria da moçada fazendo aquilo que me dá mais prazer na vida: comida!
Foi uma mudança e tanto! Não significa apenas que estou ficando mais tempo na Austrália. Na verdade é uma mudança de carreira e de estilo de vida. Para quem estava acostumada a trabalhar com números, contratos e reuniões sem fim, começar a trabalhar numa cozinha será quase como se mudar para Marte. Não faço idéia de como vai ser, mas sei do mais importante: que eu quero! E quero muito! Não importa se eu começar lavando prato e descascando batata. Não importa se eu começar ganhando pouco ou até mesmo nada. Não importa se eu chegar todo dia exausta em casa. Não importa. E sabe o por quê? Porque estarei fazendo aquilo que AMO, e isso é simplesmente maravilhoso!
Ou seja, se preparem porque vem mais Le Cordon Bleu por ai! E agora, intermediate classes, o que significa mais pratos maravilhosos, mais stress na cozinha e muito mais diversão! Só existe um porém: a forma como eu estava fazendo os posts semanais estava me dando um trabalho absurdo. Você lê em 15 minutos né? Eu demorava pelo menos umas 5 horas para escrever, revisar, fazer upload de todas as fotos, revisar denovo... E convenhamos que eu não tenho tempo sobrando. Resultado: consegui escrever até a semana 5 e depois parei por pura falta de tempo!
Então o que eu vou fazer, ou pelo menos tentar fazer, é escrever posts menores contando mais da experiência e menos das aulas. Faz sentido? Vou tentar escrever também sobre minhas viagens, e sobre o que ando aprontando aqui em Sydney! Achou interessante? Então não deixe de passar por aqui sempre! E de vez em quando um recadinho vai bem obrigada! :)
Há uns bons 4 meses atrás, quando criei este blog, o plano era fazer o curso básico de cuisine do Le Cordon Bleu, e depois viajar por 3 meses conhecendo toda a Ásia (tudo bem, toda não, impossível, mas enfim... você entendeu!). Daí eu vim para a Austrália, o curso começou, e já no primeiro dia eu senti que eu não ia conseguir largar mais isso (você se lembra deste post?). Então eu me informei daqui, pesquisei dali, pensei 3.427 vezes sobre o assunto, conversei com minha mãe (não pode faltar!) e decidi que o que eu quero mesmo é colocar o chapelão na cabeça, queimar a barriga no fogão e fazer a alegria da moçada fazendo aquilo que me dá mais prazer na vida: comida!
Foi uma mudança e tanto! Não significa apenas que estou ficando mais tempo na Austrália. Na verdade é uma mudança de carreira e de estilo de vida. Para quem estava acostumada a trabalhar com números, contratos e reuniões sem fim, começar a trabalhar numa cozinha será quase como se mudar para Marte. Não faço idéia de como vai ser, mas sei do mais importante: que eu quero! E quero muito! Não importa se eu começar lavando prato e descascando batata. Não importa se eu começar ganhando pouco ou até mesmo nada. Não importa se eu chegar todo dia exausta em casa. Não importa. E sabe o por quê? Porque estarei fazendo aquilo que AMO, e isso é simplesmente maravilhoso!
Ou seja, se preparem porque vem mais Le Cordon Bleu por ai! E agora, intermediate classes, o que significa mais pratos maravilhosos, mais stress na cozinha e muito mais diversão! Só existe um porém: a forma como eu estava fazendo os posts semanais estava me dando um trabalho absurdo. Você lê em 15 minutos né? Eu demorava pelo menos umas 5 horas para escrever, revisar, fazer upload de todas as fotos, revisar denovo... E convenhamos que eu não tenho tempo sobrando. Resultado: consegui escrever até a semana 5 e depois parei por pura falta de tempo!
Então o que eu vou fazer, ou pelo menos tentar fazer, é escrever posts menores contando mais da experiência e menos das aulas. Faz sentido? Vou tentar escrever também sobre minhas viagens, e sobre o que ando aprontando aqui em Sydney! Achou interessante? Então não deixe de passar por aqui sempre! E de vez em quando um recadinho vai bem obrigada! :)
quarta-feira, 7 de março de 2012
Le Cordon Bleu - Quinta Semana!
Outro dia estávamos
tendo uma aula sobre segurança na cozinha. Acredite ou não, cozinhar é quase
como ir para a guerra. A começar pelo uniforme, completamente projetado para
minimizar os acidentes, que não são poucos. Isso me fez lembrar uma vez que eu
estava cozinhando macarrão em casa e, quando fui escorrer a água, a panela
escorregou da minha mão e a água fervendo foi toda na minha perna. E aí você
pensa que eu tenho a perna toda queimada por causa disso? Na verdade não. E não
foi um milagre. Por sorte no dia eu estava vestindo calça jeans, e o tecido
segurou todo o calor da água. Ardeu um pouco, mas não chegou a queimar.
Esta é a razão porque
usamos calças compridas na cozinha. E não basta ser comprida, tem que ser
larga, para que a água ou o óleo fervendo que foi absorvido pelo tecido não
entre em contato com a pele. Seguindo na mesma linha, é por esta razão também
que usamos mangas compridas (tudo bem que muitas vezes a cozinha está um
inferno, e o que acontece de fato é que dobramos as mangas e só as desdobramos
quando sentimos que há algum perigo). Além das mangas compridas, a jaqueta é
transpassada na região do peito e do abdômen, para proteger a área. O avental,
além de não deixar sujar a roupa, também tem a função de proteção. Os sapatos,
de solado emborrachado, evitam escorregões. E por último, a gravata, que eu
jurava que era apenas decoração, também tem a função de torniquete no caso de
algum acidente mais grave com as facas.
E porque eu estou
falando disso hoje? Porque essa semana a gente usou muito o deep fryer (se lembra onde eles fritam
as batatas do McDonalds? Isso mesmo, aquela “pia” cheia de óleo fervendo se
chama deep fryer). A 180°C, o deep fryer frita até a sua sombra, se você bobear. Quem dirá então
um dedinho desavisado? Sem contar com os respingos. Na correria da cozinha,
ogra que sou, não quis perder tempo colocando “delicadamente” meus goujons no deep fryer. Resultado?
Respingo de óleo quente para todos os lados, e mais algumas queimaduras para a
coleção. Se não fossem as mangas compridas e a calça grossa e larga, a coisa
tinha ficado feia...
A semana 5 foi toda
dedicada ao mar. E segunda foi dia de peixinho. Ou melhor, peixão! Olha só que
beleza:
Truite au Bleu preparada por Chef John
O amigo aí no prato
parece simples, não? Mas é complicado, como qualquer receita francesa. O peixe é
cozido em caldo de peixe com cenoura, cebola, vinagre, pimenta do reino, louro
e salsinha. Sabe esse formato que ele está no prato? Não, ele não vem assim da
peixaria (era só o que faltava, peixe corcunda!). Para ele ficar neste shape, a gente amarra a ponta de um
barbante na boca do peixe, a outra ponta no rabo, e puxa. Daí o peixe é cozido
assim. Quando está pronto, a gente tira o barbante, e ele fica tortinho e bonitinho.
Truite au Bleu preparada por mim!
O peixe em si não é
assim tão complicado. O que complica mesmo é o molho, Sauce Hollandaise (só de escrever aqui eu já me arrepio toda). Eu
já tinha tentado a receita há uns 3 anos, e deu muito errado (eu não cheguei
nem perto do que deveria ser!). Entrei na cozinha morrendo de medo do danado do
molho. E tive que fazer duas vezes, porque na primeira talhou (é nessas horas
que a gente xinga em português e todos os outros alunos ficam olhando com cara
de “oi?”). No final saiu o molho, mas acabei colocando muito vinagre e ficou
horrível. Tive que apresentar assim mesmo para o chef, não dava mais tempo...
Mas não me dei por vencida. Chegou final de semana, e eu pensei: “é hoje que eu
te pego”. Então fui no supermercado, comprei os ingredientes para um belo Eggs Benedict (para quem não sabe, é um
prato de café da manhã, que leva muffin inglês, presunto ou bacon, ovo pochê e
claro, sauce hollandaise), e fui para
a guerra. O resultado? Um lindo, delicioso e perfeito molho hollandaise, pela
primeira vez na vida! Que orgulho!!!!
Ai que delícia!!! (isso aí embaixo das folhas de baby
espinafre não é geléia não... kkkk... é azeite de oliva!)
Voltando para as
aulas, na segunda também foi dia de Filet de Saint Pierre a La Munière.
Basicamente, peixe empanado e frito com molho de manteiga e salsinha. Perfeito
para comer na praia tomando uma cervejinha...
Preparado por Chef John
Preparado por mim
Aliás, tudo que
fizemos esta semana cai muito bem com uma Skol gelada (ai que saudade do meu
Rio!). Especialmente esse aí embaixo que fizemos na terça:
Goujons
de Poisson Frits com Sauce Rémoulade preparado
por Chef John
Preparado por mim
Na terça também
fizemos Supreme de Saumon à L’oseille.
O molho é praticamente manteiga, creme (olha a duplinha aí de novo!) e sorrel (uma verdura azedinha que eu
ainda não consegui descobrir a tradução para o português).
Preparado por Chef John
Ficou uma delícia, mas
eu achei muito pesado. Veja só, salmão já é um peixe gorduroso. Daí o molho é
pura manteiga com creme. Por último a gente ainda tinha que passar as batatas
cozidas na manteiga para ganhar brilho! Não fiz, fui rebelde e deixei minhas
batatas cozidas e saudáveis sem manteiga. James, um vizinho de bancada inglês
ainda me alertou da falha, e eu disse “Thanks
man, but I’m not doing this. Se eu tenho um restaurante, meu cliente morre
do coração depois do jantar!”.
Preparado por mim, sem manteiga na batata (rebeldia!)
Não deu outra, fui
apresentar o prato para chef Josef, e a primeira coisa que ele disse: “Ana,
cadê a manteiga nas batatas?”. Não pestanejei, e com todo o meu jeitinho
carioca, disse: “Sim chef, eu não esqueci. Apenas não quis colocar mais gordura
num prato já tão gorduroso. Sabe como é, hoje em dia temos que nos preocupar
com a saúde de nossos clientes”. E ainda dei uma piscada de olho do tipo “morô?”.
Ele riu e disse “ok, eu não vou levar este erro em consideração”. Terminados os
trabalhos, saindo da cozinha, ainda tive que escutar de chef Josef um “bye bye
chef Ana, you’re funny!”. “Yes chef! Hahahaha”.
Na quarta, dois pratos
com frutos de mar que ficaram uma delícia! Crevettes
sauttés avec legumes et tofu (camarões salteados com legumes e tofu) e Calmar au sel et poivre (lulas fritas
com sal e pimenta).
Crevettes sauttés avec legumes et tofu preparado
por Chef Elke
Calmar au sel et poivre preparado por Chef Elke
Meus camarões estavam
perfeitos (beutifully cooked, segundo
chef Tristen), mas acabei colocando muita cenoura e muito gengibre.
(na correria de servir o prato, esqueci a foto
de novo... que raiva! E tinha ficado linda a decoração! Uma pena...)
As lulas eram
empanadas. Ok, para empanar você tem que passar na clara de ovo antes, para que
a farinha grude bem. Adivinhem? Esqueci de passar nas claras, fui para a farinha
direto, e só percebi o erro quando as lulinhas já estavam no deep fryer. Pensei: “ferrou mané!”. Daí
quando olhei para o lado, as lulas de Ismat estavam exatamente iguais as
minhas! Perguntei para ela “Girl, você
lembrou de passar as lulas nas claras?”, e ela, com cara de horror “Oh my gosh, esqueci!”. Hahahaha, enfim, lá foi Ismat apresentar o
prato dela. E enquanto eu estava montando o meu, lá veio Ismat de volta, com um
sorrisinho escondido. Então baixinho ela me disse “O chef nem percebeu... hehe”.
Que beleza! Fui apresentar o meu e a mesma coisa, ele nem percebeu! Conclusão:
a clara não faz a menor diferença, e só está lá para complicar a receita. Ah
seus franceses abusados!
Calmar au sel et poivre preparado por mim
Fechada a semana,
depois de tanto peixe, começou a me dar uma crise de abstinência de carne...
Então passei no mercado, comprei uns New York steaks, e fiz um belo bife acebolado! Acompanhado de pommes chateau, só para praticar (afinal está chegando o dia
da prova prática!!!).
Bon Appetit!
domingo, 26 de fevereiro de 2012
Le Cordon Bleu - Quarta Semana!
Se existe uma palavra que pode mudar
sua vida na cozinha, essa palavra é “planejamento”. Durante este quase 1 mês de
curso (nossa, como passa rápido!), todos os meus dias ruins foram por falta de
planejamento. E os dias bons? Sim, isso mesmo, porque foram bem planejados.
Esta semana eu fui do inferno ao
paraíso em 24 horas. Inacreditável. E o culpado disso? Sim, o planejamento.
Isso porque semana passada, não sei se vocês lembram, deu tudo meio que certo.
O molho da carne de segunda ficou ralo, mas tudo bem. Na terça, a apresentação
estava ruim, mas tudo bem também. Na quarta, eu achei que não fosse dar tempo,
e sobrou tempo!
Daí como eu comecei essa semana?
Achando que eu já era chef. Metida, convencida, e toda toda. Nem estudei
direito as receitas. Cheguei segunda-feira na aula de demonstração achando tudo
muito fácil. “Um prato apenas? Vou tirar de letra...”. O prato era peito de
frango recheado com molho de cogumelos e cebolas, ou o chique “Suprême de Volaille Chivry”.
Preparado pelo Chef John
Anotei o passo a passo direitinho. A
receita? Cheia de detalhes. Aliás, culinária francesa é isso. Se dá para
complicar, por que não? E se dá para complicar com muita manteiga e creme, aí os
franceses tem um orgasmo culinário! Pois o simples peito de frango recheado
levava nada mais nada menos que 3 tipos de manteiga! E claro, creme, não pode
faltar nunca.
Basicamente o que temos que fazer é
limpar o peito de frango, fazer uma espécie bolso para colocar o recheio, e
cortar as beiradas para deixá-lo num formato “agradável” aos olhos. Com as
sobrinhas de frango (sem gordura) a gente faz o recheio (pois é, frango
recheado com frango, não entendi o propósito, mas ok) juntando creme e
pistaches fatiados. O problema disso tudo é que o recheio tem que ficar na
consistência de mousseline (ok, você não sabe, eu explico: mousseline é um meio
termo entre purê e creme, entendeu?). E para conseguirmos isso, temos que bater
os restos de frango no liquidificador, e depois passar numa peneira.
Então lá fui eu, alegre e
sorridente, esquartejar o meu franguinho, quando dei de cara com Chef Iris, que
muito simpática se ofereceu para me ajudar! Olha que lindo! É claro que eu
aceitei! Só que ela pegou meu frango, colocou no liquidificador, ligou, deixou
3 míseros segundos, e me devolveu: “It’s done. Agora é só peneirar”. E eu pensei...
“ai caraca, isso não vai dar certo, era para ter batido mais... mas é a chef, o
que eu posso fazer?”. Então com muita coragem peguei a peneira e comecei... e
apertei, apertei mais, apertei com todas as minhas forças, e a porcaria do
frango não passava pela peneira. Perdi a noção da hora, não tenho a menor idéia
de quanto tempo fiquei brigando com o frango. Mas foi muito, muito tempo. E aí,
se eu tivesse me planejado melhor, eu teria conseguido contornar a situação e
recuperar o tempo perdido. O que aconteceu? Me desesperei, não sabia mais o que
tinha que fazer, não sabia mais que manteiga colocar, quanto de creme
acrescentar, o que tem que temperar, o que não tem... E quando isso acontece, a
gente perde um precioso tempo olhando as anotações e tentando se achar.
Resultado: fui a última da cozinha a entregar o prato, com ridículos 50 minutos
de atraso. Isso mesmo, 50!!!!!! O frango ficou muito bom, mas eu tive que
escutar da chef um “O que houve contigo hoje Ana?” que entrou como uma faca no
meu ouvido. Fui para casa arrasada. Não sou uma pessoa competitiva, nem me acho
mais do que ninguém. Mas a única vez que eu me lembrava de ter sido a última em
qualquer coisa foi quando eu estava na segunda-série, e tirei a menor nota de
ortografia da sala, porque resolvi colocar acento em todas as palavras. Eu
tinha uns 9 anos. Enfim. Lição aprendida. Como diz minha mãe: “Errar uma vez é
humano. Duas vezes é burrice”. E como eu me recuso a ser burra, prometi para
mim mesma que o erro não seria repetido.
Preparado por mim.
No dia seguinte, o menu era sopa de
abóbora e consommé de carne.
Sopa de abóbora, preparada pelo Chef John.
Consommé de carne, preparado pelo Chef John
De novo, parecia fácil. Mas não me
deixei enganar dessa vez. Ao contrário do dia anterior, me planejei o máximo
que pude. Li a receita umas 10 vezes. Li o passo a passo mais umas 20. Tentei
passar na minha cabeça todos os momentos, desde a separação dos utensílios e
dos ingredientes até a preparação do prato para apresentação ao chef. Entrei na
cozinha sem olhar para os lados. Não tive que pensar um segundo no que fazer,
já estava tudo no automático. Eu estava tão concentrada que nem percebi o quanto
que eu estava adiantada. Até que, quando fui tirar a abóbora do forno, Gustavo,
um amigo brasileiro me disse: “rapidinha hein!!!”. Daí que fui olhar para os
lados. E pasmem! Ninguém estava tão adiantado quanto eu. Olhei para o relógio,
fiz umas contas rápidas e pensei: “Caramba, vou servir 15 minutos antes que o
limite!”. Então continuei no mesmo ritmo, e muito, muito orgulhosa de mim
mesma, fui a primeira da cozinha a apresentar a sopa para Chef Josef. O melhor
de tudo? A sopa estava perfeita! Então chef Josef me disse: “Well done Ana.
Agora vá lá e me prepare um belo consommé!”.
(aqui eu deveria colocar a foto da
minha sopa de abóbora. Mas como eu sempre tenho que esquecer algo, acabei de me
dar conta que, na euforia de apresentar o prato mais cedo, esqueci
completamente da foto... aff!!!)
O consommé já estava no fogo,
reduzindo e ganhando cor e sabor. E o truque é que quanto mais ele fica no
fogo, mais sabor e cor ele ganha. Então, sem muito o que fazer, comecei a
ajudar os outros. E pela primeira vez em todo o curso, consegui ajudar Eden (se
lembra dele, o mais rápido da cozinha, que sempre termina mais cedo e ajuda
todos?). Falei: “Eden, finalmente, vou conseguir retribuir um pouquinho do que
você faz pela gente sempre!”. E enquanto eu lavava a louça, pensava: “como é
possível, isso! Um dia, sou a última, outro dia sou a primeira!
Inacreditável...”.
A gente tinha que servir o consommé
às 17:15h. Então as 17:00h eu coloquei meus legumes julliene no forno, aqueci
um pouquinho, apaguei o fogo do consommé, servi o prato e apresentei ao chefe.
O consommé não ficou perfeito porque poderia ter ganhado mais cor. Mas o sabor estava
ótimo, o caldo estava bem transparente, e não havia sinais de gordura. “Well
done again Ana!”. “Thanks chef!”.
Consommé preparado por mim
Fui para casa tão feliz! Leve,
confiante, renovada! Até consegui ter forças para ainda correr 6 km! Depois de
ficar 3 horas e meia em pé cozinhando, não é fácil! Mas aí quando fui me preparar
para a aula do dia seguinte, surpresinha: Foie
de veau sauté au lard, ou melhor dizendo, fígado. Arghhhh!!! Detesto! Tenho
trauma de criança. Era obrigada a comer porque faz bem para a saúde. Mas não
tem nada mais disgusting que fígado!
Fico toda arrepiada só de pensar... O que salvou o dia foi que além do fígado,
também fizemos de sobremesa Bavarois à la
vanille com Raspberry coulis e
chantilly. Uma delícia!
Preparado pela Chef Elke
Vou me limitar a dizer que sim, meu
fígado ficou bom, segundo chef Tristen. Mas foi no escuro, porque não cheguei nem
a provar (arghhhh de novo!). Tudo terminado, sem a menor expectativa de levar o
fígado para casa (arghhhh quantas vezes for necessário!), comecei a oferecer a
todos meu fígado (a carne, não o órgão, só para esclarecer). Ninguém quis.
Então ofereci para os funcionários da limpeza. Ninguém quis! Só me restou jogar
no lixo, o qual para minha surpresa já estava abarrotado com o fígado de todos
os outros alunos! Um pecado! Mas sinceramente, quem é que gosta de fígado? E
porque eu estou aprendendo isso no básico? Vai saber!
Fígado (arghhhh!) preparado por mim. Estava arrumadinho,
mas eu esqueci de tirar a foto antes do chef provar...
O Bavarois ficou muito bom também, mas o coulis deveria ter consistência de coulis (mais líquido), e não de geléia
(como vocês podem ver, cozinhou demais e virou uma deliciosa geléia. Eu gostei
assim! Mas está errado... rs).
Bavarois preparado por mim.
Semana que vem, temos peixe na segunda,
na terça e na quarta! Vou começar a tentar postar aqui as receitas. Não
prometo, não sei se vou ter tempo, mas acho que vai ser bacana para vocês,
afinal, é Le Cordon Bleu, né minha gente? J
sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012
Le Cordon Bleu – Terceira Semana!
Após 3 semanas de curso, é incrível
como algumas coisas já entraram no automático. Por exemplo, todo santo dia de
curso eu acordo às 6:45h, troco de roupa, coloco na bolsa o uniforme da cozinha,
tomo café, preparo 2 sanduíches, escovo os dentes, penduro a sacola de livros
nas costas, saio catando tudo que estou esquecendo e colocando na bolsa, penduro
a bolsa no ombro esquerdo, toolkit no ombro direito, ticket do ônibus
no bolso esquerdo, iphone no bolso
direito, e lá vou eu que nem burro de
carga para pegar o ônibus. Quer outro exemplo? Entre a aula de demonstração e a
prática na cozinha, eu corro até o vestiário, deixo meus livros no locker, pego minha sacola de utensílios,
como um sanduíche em 3 segundos, prendo meu cabelo, corro até a cozinha que
fica do outro lado do prédio, coloco meu avental, prendo meus panos de prato no
avental, e fico estudando a receita do dia até a hora que o chef nos chama para
dentro. Dentro da cozinha eu deixo minhas tralhas no balcão, lavo as mãos,
entro na fila para pegar a tábua de cortar e as vasilhas (mais tralha!), volto
para a minha bancada, pego minha bandeja de ingredientes, separo os utensílios que
vou precisar, e a partir daí são 3 horas e meia cortando, cozinhando, provando,
se cortando, se queimando, e etc etc etc.
Outra coisa que entra no automático
é o teamwork. Imprescindível na
cozinha. Enquanto uns estão num esquema de competição, eu e Ismat (minha
vizinha de bancada e um presente de amiga na minha vida) não fazemos nada sem
pensar uma na outra. Se eu vou pegar farinha, pego para nós duas. Se ela vai
checar a torta no forno, ela checa para nós duas. Ela não precisa pedir
permissão para usar meus utensílios, nem eu os dela. Se ela está atrasada, eu a
ajudo. Se estou fazendo algo errado, ela me avisa. No final, o resultado é bem
superior ao que seria se fizéssemos cada uma por si. E aqueles que estão no
esquema competição? À medida que as receitas complicam, é quase um suicídio
tentar fazer tudo sozinho. Pelo andar da carruagem, não vai demorar muito até eles
entenderem isso.
Ismat é minha maior parceira, mas
não é a única. Eden, meu vizinho de frente, é o mais rápido de toda a cozinha.
Enquanto eu pisco o olho, ele já cortou 3 cebolas, 5 cenouras e um saco de
batatas. Com Eden não dá para fazer o mesmo esquema que faço com Ismat, porque
ele está sempre um estágio à frente. O que acontece então? Toda aula prática, sem
nenhuma exceção, Eden é o primeiro a acabar. O que ele faz? Não, ele não fica descansando,
conversando, vendo celular, nada disso. Simplesmente Eden começa a limpar a
sujeirada de todos. Sem ninguém nunca ter pedido isso a ele. Eu nunca consegui
ajudar Eden (nem eu nem ninguém). E ele sempre, desde a primeira aula, me
ajudou (não só a mim, mas a todos!). Eu acho isso simplesmente espetacular e
tenho certeza que na hora de contratar, os restaurantes também acharão.
Semana a semana as receitas vêm
ganhando técnica e complexidade. Na
segunda, preparamos Contrefilet de Bouef Rôti, ou simplesmente o nosso querido
rosbife. Acompanhado de vagens francesas, cenouras e abobrinhas glacê e batatas
chateau.
Preparado pelo chef John
Parece tranqüilo, só colocar a carne
no forno e esperar. Será mesmo? Pra começar, você tem que limpar a carne, tirar
toda aquela gordura dura e transparente que vira uma borracha quando cozida
(não estamos falando aqui daquela gordurinha gostosa que dá sabor a carne).
Limpou? Agora é hora de amarrar a carne com um barbante, para que ela não perca
o formato quando cozinhar. E aí tem toda uma técnica, você segura o barbante
aqui, roda acolá, dá três nozinhos de um lado, amarra do outro... Uma loucura.
É claro que eu não consegui de primeira. Comecei de novo umas 5 vezes, e por
último, tanto que fiz que a carne ficou bem amarrada, mas eu não conseguia dar
o nó final. “Chef, por favor, não sei como dar o último nó de forma que o resto
não se solte”. E a chef: “Nem eu! Nunca vi essa sua técnica. É nova?”. Pois é,
inventei uma nova técnica de amarrar carne...rs. O resto é relativamente
simples. Em resumo, é selar e colocar a carne numa panela com vinho tinto e
caldo de carne, e deixar no forno, checando de vez em quando a temperatura da carne com um termômetro. Minha carne cozinhou direitinho. Meu problema
foi o molho. Se lembra que na semana passada acabei reduzindo-o demais e ele virou um
xarope? Nessa semana reduzi de menos e ficou igual água. Ai que pobreza... E o
pior foi ter que apresentar o prato com aquela coisa rala e sem graça. Não fui
embora para casa feliz esse dia.
Preparado por mim. Olha que desastre o molho...
Daí terça chegou, com um dos pratos
que eu mais esperava: Carré d’agneau en persille com Ratatouille Provençale. Em
outras palavras: Carré de cordeiro em crosta de salsinha com ratatouille
(beringelas, abobrinhas, pimentões, tomates e cebolas em cubos) ao estilo
provençal.
Preparado pelo chef John (o ratatouille está atrás do carré.
Ao lado temos Pommes Anna, que ele preparou apenas como
demonstração).
Minha carne preferida! Amo amo amo! Aprendemos
a fazer no forno, com essa crosta de salsinha que é um arraso, e o ratatouille
que ficou uma delícia! Meu carré ficou no ponto, (poderia ter ficado um
pouquinho mais mal passado, mas tudo bem), o molho ficou na consistência certa,
o ratatouille perfeito... mas claro, sempre tem algo para atrapalhar. Dessa vez
foi a apresentação. “Ana, como é que você traz um prato assim para mim??????” “Me
desculpe chef, derramei molho, tentei limpar, pelo jeito não consegui...” “Desta
vez vou aceitar, mas na próxima você pega outro prato e monta de novo,
entendido?” “Yes chef”.
Preparado por mim. Dá pra ver a bagunça do prato?
Então chegou quarta. E o desafio?
Clafoutis aux cerises com Sauce Anglaise (torta de cerejas com creme Anglaise).
Preparado pela chef Elke
Esta é uma receita que exige muita
atenção e cuidado com os detalhes. Tudo pode dar errado. Para começar a massa, dificílima de manusear,
dificílima de chegar no ponto, dificílima de colocar na forma... Teve gente que empacou ai e não saiu mais. Eu
quase empaquei. Primeiro porque coloquei dois ovos em vez de um (Ismat e Eden,
ao mesmo tempo, me alertaram do erro!). Chamei o chef e ele conseguiu tirar um
ovo sem quebrar a gema (isso só com experiência!), mas acho que deixei um pouco
de clara desse segundo ovo lá. O resultado é que a minha massa ficou mais
molhada que o normal. O que se faz numa hora dessas? Mais farinha. Mas só fui
entender isso depois de passar 15 minutos me estressando com aquele grude na
minha mão. Depois, na hora de colocar na forma, a danada quebrou, e tive que
abrir ela de novo. Deu certo,fui de segunda, mas me atrasei. E aí começou a
bater aquele desespero: “não vai dar tempo, não vai dar tempo”. Até que olhei
para o lado, e percebi que, com exceção do Eden e da Ismat, todos estavam tão
ou mais atrasados que eu! Até a galerinha da competição estava muito atrás, uns
ainda brigando com a massa, outros tendo que fazer tudo de novo. No final é
claro que deu tempo, até sobrou. Torta no forno, tudo arrumado e limpo, e pela
primeira vez em 3 semanas me vi sem ter o que fazer. Então a cabeça começa a
funcionar, e “Chef, o pedaço da torta no prato, precisa ser triangular?” O chef
me olhou desconfiado, e disse: “Não necessariamente”. “Thanks chef”. E com um
sentimento incrível de liberdade criei uma apresentação completamente diferente
das demais. E ainda acrescentei uma canelinha com açúcar que foi muito bem com
as cerejas. Só esqueci de tirar a foto! Hahaha! Mas quando cheguei em casa,
tentei repetir, e eis ai mais ou menos como ficou. Sendo que na aula eu
coloquei um “caminho” de canela em pó em cima do açúcar.
Preparado por mim, mais ou menos igual ao que fiz na aula.
Ficou faltando o caminho de canela em cima do açucar.
Na saída da cozinha, chef de
bobeira, não agüentei e perguntei: “Chef, gostou da decoração?”. “Yes, yes,
very creative”. “Thanks chef!” Aêêêêêêê!!!!!!!!!!!!!!!
sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012
Le Cordon Bleu – Segunda Semana!
Primeiramente,
gostaria de dizer que sim, ainda tenho os 10 dedos! Mas verdade seja dita, minhas
mãos continuam sofrendo. Saíram os cortes, entraram as queimaduras. E que
festival de queimaduras! Não se salvou um dedo sequer. Esta semana nós usamos muito o forno, todos os
dias, e a cozinha virou uma sinfonia de “ai!”, “ui!”, e de vez em quando um “aaaaaaaaaaaaaaaiiii!!!!!!!!!”.
No final do terceiro dia, ninguém mais ligava se estava queimando ou não, as mãos
já estavam dormentes mesmo, a pele já estava toda esturricada, a bolhas já tinham
virado calos... e adeus às mãos de princesa, acho que nunca mais as terei.
Outra dificuldade da
semana foi chegar ao curso. Perder o ônibus virou rotina. E aí você pensa: “isso
que dá dormir demais e chegar atrasada no ponto! Bem feito!”. Obrigada pela
parte que me toca, mas não foi o caso. Eu cheguei adiantada no ponto todos os
dias. O problema é que o transporte público aqui na Austrália funciona muito
bem. Tão bem, que ao invés do ônibus chegar atrasado, ele chega adiantado! No
primeiro dia, cheguei 3 min mais cedo no ponto, e quando olho para a esquerda,
olha o ônibus lá!!! Tá vindo? Não, tá indo! Já passou... Daí no segundo dia,
cheguei 8 min mais cedo, e “Vale a pena ver de novo” entrou no ar, exatamente a
mesmíssima cena, com direito a ônibus indo embora em câmera lenta e piiiiiiiiiiiiiii
saindo da minha boca enquanto eu corro desnecessariamente na esperança ridícula
que o ônibus vai parar e me esperar. Então no terceiro dia, com muita raiva no
coração, eu pensei: “hoje vou acabar contigo seu desgraçado!”. E foram 10
minutos mais cedo no ponto. Cheguei lá, apoiei meus 20 quilos de tralha no
chão, cruzei os braços, angulei as sombracelhas, e fiquei lá, batento
pezinho... e bati pezinho, e bati pezinho, e fiquei a bater pezinho por exatos...
10 minutos! Sim, dessa vez ele chegou na hora. Tenho certeza que escutei o
pensamento do motorista: Gotcha! Ok, 3 x 0, mas eu juro que vai ter revanche.
Fora as pedras no
caminho, a semana foi excelente. E eu já estou preparando pratos que até minha
mãe duvidaria. Tudo bem que nem tudo saiu perfeito, mas não se esqueça que eu
ainda estou aprendendo. E que eu entendo mais ou menos 80% do que o chef diz (60%,
se o chef for italiano, e 40% se o chef for australiano, eita sotaque difícil!).
Ou seja, algumas vezes eu simplesmente não sei o que deve ser feito. Quando
consigo perguntar de novo ao chef, ótimo, mas quando não consigo, o que faço é
olhar para os outros alunos, descaradamente, e copiar o que eles estão fazendo.
E claro, torcer para que eles estejam fazendo certo.
Na segunda-feira,
primeira aula da semana, nossa meta era preparar uma quiche Lorraine. Então
primeiro a gente faz a massa, deixa a massa descansar e enquanto isso prepara
os outros ingredientes (bacon e queijo). Depois a gente assa a massa sem o
recheio, prepara o recheio, coloca o recheio, assa mais um pouco, e pronto,
temos uma linda quiche Lorraine. Parece fácil né? Mas não é. Foram 3 horas e
meia numa confusão total, 3.574 detalhes para prestar atenção e o fogão, de
pirraça, resolveu não esquentar muito (será que ele ficou com pena das minhas
mãos? Obrigada pela preocupação, querido fogão. Mas eu preciso que você
esquente, mon amour). Ou seja, na hora de apresentar à chef, a massa estava
ainda um pouco crua. O que me salvou, de novo, foi o tempero, na medida certa,
excelente segundo a chef. Aeeeee!
Daí na terça, a coisa
complicou mais. Além de termos que preparar e assar uma Pissaladiére (pizza
francesa em formato retangular, sem queijo, e com minhas muito amadas
anchovas!), tivemos também que preparar o super chique Pouding de riz à La
Française (primo rico do nosso arroz-doce, de festa junina). E pela primeira vez no curso eu tive vontade
de chorar. Não porque cortei ou queimei a mão (meu lado macho não me deixa
chorar por essas coisas), mas porque me vi completamente perdida umas 10 vezes.
Sabe quando você vai até o outro lado da cozinha, e quando chega lá, pensa: “mas
o que eu vim fazer aqui mesmo?”. E não, eu não dormi na aula de demonstração,
muito pelo contrário, acompanhei e anotei passo a passo. Mas às vezes a gente
está num dia ruim mesmo. O fato é que esqueci de botar o sal e o açúcar na
massa da Pissaladiére, e o leite do pudim quase me matou do coração quando
levantou fervura e por pouco, muito pouco mesmo, não entorna no fogão inteiro.
Pelo menos meus reflexos estão em dia. Em 1 segundo a panela do leite já estava
em cima da pia, meu rosto virado para o lado – sem coragem para ver a cena - e
eu pensando: “Vai, derrama seu desgraçado!”. Não derramou! Chegou na bordinha e
não derramou! - meus agradecimentos ao santo dos cozinheiros avoados. No final
de tudo, para minha grande surpresa, a massa da Pissaladiére ficou ótima, e o
pudim não ficou assim dos melhores, mas passou na média. Um milagre, levando em
consideração as 3 horas e meia de horror.
Então chegava quarta-feira,
e eu sinceramente entrei em desespero. O menu? Pernas de carneiro ao molho de
vinho tinto, risotto, vagens francesas e cenouras glacê (em formato de
barril!!!). “Não, não vai dar tempo, não é possível, assim não dá. Ei Cordon
Bleu, eu ainda tô na segunda semana do básico hein! Vocês tem certeza disso????”
Foi o que pensei quando cheguei em casa na terça e fui estudar para o dia
seguinte. Bom, eu não tinha outra escolha a não ser tentar me preparar ao
máximo. E assim fiz. Estudei cada ingrediente, suas
quantidades, o que fazer com cada um, quando fazer, que utensílios usar, e etc
etc etc. No dia seguinte, na aula de demonstração, eu não pisquei o olho, eu não
olhei para os lados, eu não deixei de prestar atenção 1 segundo sequer. Eu era
uma máquina. Resultado: quando cheguei na cozinha, sabia exatamente o que fazer,
não perdi um milésimo de segundo, minha mente era um workflow, e enquanto eu estava no passo 3, ela já planejava os
passos 4, 5 e 6. Pela primeira vez, me senti uma profissional na cozinha. O
resultado dos pratos? Não, nem foi dos melhores. O risotto estava com boa
consistência, mas faltou sal (se bem que o chef falou isso para a turma
inteira, então acho que é ele que gosta de sal demais). O carneiro podia ter
cozinhado mais (mas quando tirei do forno, pedi ao chef para ver se estava
cozido, e ele disse que sim! Enfim, na próxima vez levarei em consideração também
a minha opinião). E o molho? Tínhamos que reduzir (significa deixar em fogo
baixo para que a água evapore e o molho ganhe consistência). Eu juro que
entendi que quanto mais reduzido, melhor. Então deixei uns 40 min em fogo baixo
e o molho virou um xarope. Achei lindo, achei que estava perfeito, achei que
estava arrasando, e quando mostrei ao chef, surpresinha: reduziu demais. Para
completar, minhas vagens estavam muito cozidas (elas tem que ficar al dente).
Pelo menos as cenouras estavam perfeitas. Mas quem quer saber delas?
Enfim, apesar do
resultado ruim, eu fui feliz para a casa. Consegui me organizar na cozinha,
manter a calma, pensar em etapas, e não entrar em desespero. Para mim foi um
passo enorme! Totalmente necessário para que eu ganhasse confiança novamente e
continuasse acreditando que estou no caminho certo. A realidade é que pela
primeira vez na minha vida eu realmente AMO o que estou estudando. Não me
importo de perder as noites e finais de semana lendo sobre o assunto e
praticando. Porque para mim não é estudo, é diversão, é felicidade, é bom
demais.
Para as próximas
semanas, prometo que me lembrarei de tirar fotos dos pratos. Mas se um deles
queimar, vou falar que esqueci, e vocês devem fingir que acreditam, combinado? J
domingo, 5 de fevereiro de 2012
Le Cordon Bleu - Primeira semana!
“Então é assim que a
banda toca...”, foi o meu pensamento após o primeiro dia de curso, deitada na
minha cama, olhos vidrados no teto, mochila jogada num canto do quarto, toolkit no outro, o corpo sem a menor
condição de fazer um movimento a mais. Exausta é pouco, eu estava completamente
esgotada. “E eles disseram que a primeira semana é mais devagar? No way!”. Bom, a verdade é que a gente
vai se acostumando. Após 3 dias de curso (sim, são apenas 3 dias por semana),
eu já consigo acreditar no impossível.
Para começar, é
preciso chegar no curso. Então a gente anda até o ponto de ônibus, espera o ônibus,
pega o ônibus, salta do ônibus, anda uns 600m (ladeira acima, o que é um
detalhe deveras importante) e lá está o toldinho azul da Le Cordon Bleu. Fácil?
Seria, se o toolkit não pesasse uns 10 quilos, e minha mochila, completamente
abarrotada com tudo que eu tenho que levar para a escola, não pesasse outros 10.
Sem brincadeira, estou pensando em levar tudo numa mala de bordo com rodinhas
lindas e deslizantes. Vou parecer louca, mas ok, minhas costas agradecem.
O curso começa as 9:00h.
Mas como atrasos não são tolerados, e eu me conheço há 28 anos, me engano
mudando o horário para as 08:30h. Assim consigo conviver tranquilamente com
meus 15 minutos usuais de atraso, tão recorrentes como o meu café com leite de
todo dia. Quem não aprende a se enganar não sabe a delícia que é comer bolo de
chocolate com carinha de salada de frutas. Voltando ao assunto, a primeira aula
do dia dura 2 horas e é pura teoria, com assuntos variando desde “a indústria”
até “padrões de higiene na cozinha”.
Digamos que estes não são exatamente os assuntos preferidos de quem
gosta mesmo é de colocar a mão na massa e produzir um belo Quiche Lorraine.
Como eu, por enquanto, ainda estou achando tudo muito interessante, até que me
comportei direitinho e a cabeça não caiu nenhuma vez. Mas algo me diz que lá
pela terceira ou quarta semana, este cenário vai mudar drasticamente...
Passada a teoria
matinal, às 11:00h é hora do intervalo. Fartos 30 minutos, nos quais a gente
tem que comer algo (o próximo intervalo será apenas às 14:00h), trocar
completamente de roupa, incluindo dar nó em uma gravata feita de um lenço
triangular (o que, acredite, me toma uns 10 minutos, por baixo) e se der tempo,
ir ao banheiro. Às 11:30h em ponto começa a próxima aula, mas eu como boa nerd cegueta, gosto de pegar
um lugar bem lá no cuspe do chef. Então para mim, o intervalo dura apenas 25
minutos, e olhe lá.
As próximas 2 horas e
meia são de demonstração, ou seja, um dos chefs prepara todos os ingredientes e
os cozinha na nossa frente. E aí você pensa que é tranquilão, igual a assistir
ao programa da Ana Maria Braga? Grande engano. Sem exageros, não dá para ver
celular, conversar com o coleguinha do lado, muito menos (muito menos mesmo)
sair de sala para ir ao banheiro. Digamos que se você perder 30 segundos da
explicação, já era, você já não sabe mais o que deve ser feito. Agora,
lembre-se, como boa estrangeira, meu inglês não é nativo e the book que estava on the
table não era about culinary. Ou
seja, cada dia eu aprendo umas 20 palavras diferentes, no mínimo. E claro, para complicar um pouco mais (porque
estava muito fácil...), sendo a escola uma escola orgulhosamente francesa, não
basta aprender em inglês, tem que aprender em francês também! Acho que vou
liberar espaço no hard drive deletando os nomes em português, ou meu cérebro
vai queimar junto com o Ragôut d’aubergines et de tomates da aula de quarta.
Galera esperando para entrar na aula de demonstração
Passada a
demonstração, mais um incrível intervalo de 30 minutos, no qual teoricamente
deveríamos almoçar, mas o que dá tempo mesmo é de comer o sanduiche frio feito
em casa. Aliás, no primeiro dia, 90% da turma (incluindo eu) ingenuamente achou
que teríamos tempo para comer algo rápido em alguma cantina da escola. Na
ausência do tempo e da cantina (pasmen!), todos ficamos sem almoço. E passar
fome já é ruim. Agora imagine passar fome cortando cenouras? “Eu como ou eu
corto? Eu como (diabinho). Não, eu corto (anjinho). Não, eu como (diabinho). Pronto,
comi (o diabinho sempre vence)”. Acho que ninguém viu. O fato é que nunca comi
uma cenoura tão deliciosamente crua e sem sal em toda a minha vida.
Como você já percebeu,
depois da demonstração, nós vamos para a prática. São 3 horas e meia, em pé, lavando,
descascando, lavando, cortando, lavando, cozinhando, lavando de novo... Sabe
aquela propaganda de TV de produto de limpeza que a dona de casa fala: sai
neura! Enfim, se você nunca viu, ok, o pessoal da Le Cordon Bleu também não.
Nunca vi gente tão obcecada por higiene. E não é só passar detergente não hein,
tem que desinfetar também. No final você já não sabe se está desinfetando a
faca ou a batata, mas abafa o caso.
Agora um pouquinho do
que foi ensinado nestes 3 primeiros dias:
1º dia: Como cortar
legumes em julienne, brunoise e mirepoix. Vou lhes poupar dos detalhes
técnicos, mas resumindo, julienne são tiras bem fininhas, brunoise são cubos
bem pequenininhos e milimetricamente iguais, e mirepoix é uma bagunça geral (é
só cortar de qualquer jeito e tchan tchan tchan tchan, temos o chiquerésimo
mirepoix). Primeiro dia com as facas novas, eis aí abaixo o resultado:
O primeiro corte foi este na palma da mão, mas bem pequenininho...
O segundo, na última cebola do dia, um pouco pior...
O mesmo corte da foto acima, mas sem o band-aid.
Dá para ver as unhas cortadas? As do dedão e do anelar? Não, não é a última
moda aqui na Austrália. Foi com a faca mesmo, e por pouco não
foram mais dois dedos cortados!
2º dia: Como preparar
caldos de carne, galinha, peixe e vegetais. O chef demonstrou como preparar os
quatro, mas na cozinha nós só preparamos o de galinha e o de peixe. Vocês não
podem imaginar como é dura a carcassa de um peixe grande. Não é a toa que o
pessoal das peixarias usa aquelas mega peixeiras. A gente tinha que cortar a
carcassa em pedaços pequenos. Sabe filme de terror, quando o assassino segura a
faca lá em cima e, com toda a força, desce a faca no pescoço da vítima? Pois é, foi
um esquartejamento de peixe, sangue de peixe pra tudo quanto era lado, uma lambança
geral. No final, meu caldo de peixe tinha gosto de salsinha, cebola, aipo... menos
de peixe. Mas meu caldo de galinha ficou bom! “Wonderful color!”, disse o chef.
Aêêêêê!!!!
3º dia: Chegou a hora
de preparar comida de verdade!
- Pommes château: batatas
em formato de barril, primeiramente escaldadas, depois fritas, depois assadas
no forno. Vocês não imaginam o trabalho que dá para colocar estas batatas em formato
de barril. Bem coisa de corte francesa mesmo. Mas elas ficam uma delícia.
- Carrots et navets glacês:
cenouras e nabos, também em formato de barril (aff!), cozidas numa solução de
água, manteiga e açúcar (isso mesmo, açúcar!). Depois de cozidas, tiramos as
cenouras e nabos da solução e deixamos a solução virar tipo um xarope. Daí é só
colocar as cenouras e nabos de novo lá por alguns segundos. Eles ficam super
brilhosos e estranhamente gostosos.
- Ragôut d’ aubergines
et tomates: Esse nome todo chique quer dizer berinjela e tomates cortados em
cubos e fritos. Esse foi o último prato que começamos. Neste momento, o açúcar do
carrots e navets glacês estava caramelizando, e as pommes château estavam no forno.
Com tanta coisa ao mesmo tempo acontecendo, minhas berinjelas quase
queimaram!!! L Percebi a tempo, tirei do fogo, e lá veio o
chef: “Porque isto aqui não está no fogo?”, “Porque estavam queimando, chef”, “Se
estão queimando e ainda estão cruas, ou você abaixa o fogo, ou coloca mais
azeite”.”Yes, chef”. Bom, como o fogo já estava no mínimo (fogão industrial é
surreal de forte!), eu taquei azeite nas berinjelas. Ok, parou de queimar, mas
ficou muito gorduroso.
No final, preparamos
um prato (com direito a decoração) e apresentamos ao chef. Quando chegou a minha vez, eu estava muito,
muito nervosa. Se ele falasse que estava horrível, acho que eu chorava, sei lá,
desmaiava, algum drama desses. Pois bem, primeiramente a apresentação: “Está
ok, mas tem muito óleo no prato por causa do ragout que está muito gorduroso”. “Ahhhhhh
pô chef! Você que disse para eu colocar mais azeite!!!!” É claro que não falei
nada disso. Só pensei. Mas então, ele pegou o garfo, e como em câmera lenta,
ele deu uma garfada, e ele ajeitou a garfada, e ele comeu a garfada, e ele degustou
a garfada, e quando estes 3 segundos já viravam uma eternidade, ele disse: “Muito
bom, a apresentação está ruim, mas o tempero está excelente, e no final das
contas, é isso que importa. Good job!”. “Thanks Chef!”
Vocês não podem
imaginar minha alegria! A sensação foi quase a de ganhar Hell’s Kitchen. Toda a
semana, todo o suor, todo o cansaço valeram a pena. E eu nem gosto de berinjela,
mas esse dia comi berinjela no jantar, preparada na cozinha da Le Cordon Bleu,
aprovada pelo Chef Josef da Le Cordon Bleu. Demais!
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