Esta é a razão porque
usamos calças compridas na cozinha. E não basta ser comprida, tem que ser
larga, para que a água ou o óleo fervendo que foi absorvido pelo tecido não
entre em contato com a pele. Seguindo na mesma linha, é por esta razão também
que usamos mangas compridas (tudo bem que muitas vezes a cozinha está um
inferno, e o que acontece de fato é que dobramos as mangas e só as desdobramos
quando sentimos que há algum perigo). Além das mangas compridas, a jaqueta é
transpassada na região do peito e do abdômen, para proteger a área. O avental,
além de não deixar sujar a roupa, também tem a função de proteção. Os sapatos,
de solado emborrachado, evitam escorregões. E por último, a gravata, que eu
jurava que era apenas decoração, também tem a função de torniquete no caso de
algum acidente mais grave com as facas.
E porque eu estou
falando disso hoje? Porque essa semana a gente usou muito o deep fryer (se lembra onde eles fritam
as batatas do McDonalds? Isso mesmo, aquela “pia” cheia de óleo fervendo se
chama deep fryer). A 180°C, o deep fryer frita até a sua sombra, se você bobear. Quem dirá então
um dedinho desavisado? Sem contar com os respingos. Na correria da cozinha,
ogra que sou, não quis perder tempo colocando “delicadamente” meus goujons no deep fryer. Resultado?
Respingo de óleo quente para todos os lados, e mais algumas queimaduras para a
coleção. Se não fossem as mangas compridas e a calça grossa e larga, a coisa
tinha ficado feia...
A semana 5 foi toda
dedicada ao mar. E segunda foi dia de peixinho. Ou melhor, peixão! Olha só que
beleza:
Truite au Bleu preparada por Chef John
O amigo aí no prato
parece simples, não? Mas é complicado, como qualquer receita francesa. O peixe é
cozido em caldo de peixe com cenoura, cebola, vinagre, pimenta do reino, louro
e salsinha. Sabe esse formato que ele está no prato? Não, ele não vem assim da
peixaria (era só o que faltava, peixe corcunda!). Para ele ficar neste shape, a gente amarra a ponta de um
barbante na boca do peixe, a outra ponta no rabo, e puxa. Daí o peixe é cozido
assim. Quando está pronto, a gente tira o barbante, e ele fica tortinho e bonitinho.
Truite au Bleu preparada por mim!
O peixe em si não é
assim tão complicado. O que complica mesmo é o molho, Sauce Hollandaise (só de escrever aqui eu já me arrepio toda). Eu
já tinha tentado a receita há uns 3 anos, e deu muito errado (eu não cheguei
nem perto do que deveria ser!). Entrei na cozinha morrendo de medo do danado do
molho. E tive que fazer duas vezes, porque na primeira talhou (é nessas horas
que a gente xinga em português e todos os outros alunos ficam olhando com cara
de “oi?”). No final saiu o molho, mas acabei colocando muito vinagre e ficou
horrível. Tive que apresentar assim mesmo para o chef, não dava mais tempo...
Mas não me dei por vencida. Chegou final de semana, e eu pensei: “é hoje que eu
te pego”. Então fui no supermercado, comprei os ingredientes para um belo Eggs Benedict (para quem não sabe, é um
prato de café da manhã, que leva muffin inglês, presunto ou bacon, ovo pochê e
claro, sauce hollandaise), e fui para
a guerra. O resultado? Um lindo, delicioso e perfeito molho hollandaise, pela
primeira vez na vida! Que orgulho!!!!
Ai que delícia!!! (isso aí embaixo das folhas de baby
espinafre não é geléia não... kkkk... é azeite de oliva!)
Voltando para as
aulas, na segunda também foi dia de Filet de Saint Pierre a La Munière.
Basicamente, peixe empanado e frito com molho de manteiga e salsinha. Perfeito
para comer na praia tomando uma cervejinha...
Preparado por Chef John
Preparado por mim
Aliás, tudo que
fizemos esta semana cai muito bem com uma Skol gelada (ai que saudade do meu
Rio!). Especialmente esse aí embaixo que fizemos na terça:
Goujons
de Poisson Frits com Sauce Rémoulade preparado
por Chef John
Preparado por mim
Na terça também
fizemos Supreme de Saumon à L’oseille.
O molho é praticamente manteiga, creme (olha a duplinha aí de novo!) e sorrel (uma verdura azedinha que eu
ainda não consegui descobrir a tradução para o português).
Preparado por Chef John
Ficou uma delícia, mas
eu achei muito pesado. Veja só, salmão já é um peixe gorduroso. Daí o molho é
pura manteiga com creme. Por último a gente ainda tinha que passar as batatas
cozidas na manteiga para ganhar brilho! Não fiz, fui rebelde e deixei minhas
batatas cozidas e saudáveis sem manteiga. James, um vizinho de bancada inglês
ainda me alertou da falha, e eu disse “Thanks
man, but I’m not doing this. Se eu tenho um restaurante, meu cliente morre
do coração depois do jantar!”.
Preparado por mim, sem manteiga na batata (rebeldia!)
Não deu outra, fui
apresentar o prato para chef Josef, e a primeira coisa que ele disse: “Ana,
cadê a manteiga nas batatas?”. Não pestanejei, e com todo o meu jeitinho
carioca, disse: “Sim chef, eu não esqueci. Apenas não quis colocar mais gordura
num prato já tão gorduroso. Sabe como é, hoje em dia temos que nos preocupar
com a saúde de nossos clientes”. E ainda dei uma piscada de olho do tipo “morô?”.
Ele riu e disse “ok, eu não vou levar este erro em consideração”. Terminados os
trabalhos, saindo da cozinha, ainda tive que escutar de chef Josef um “bye bye
chef Ana, you’re funny!”. “Yes chef! Hahahaha”.
Na quarta, dois pratos
com frutos de mar que ficaram uma delícia! Crevettes
sauttés avec legumes et tofu (camarões salteados com legumes e tofu) e Calmar au sel et poivre (lulas fritas
com sal e pimenta).
Crevettes sauttés avec legumes et tofu preparado
por Chef Elke
Calmar au sel et poivre preparado por Chef Elke
Meus camarões estavam
perfeitos (beutifully cooked, segundo
chef Tristen), mas acabei colocando muita cenoura e muito gengibre.
(na correria de servir o prato, esqueci a foto
de novo... que raiva! E tinha ficado linda a decoração! Uma pena...)
As lulas eram
empanadas. Ok, para empanar você tem que passar na clara de ovo antes, para que
a farinha grude bem. Adivinhem? Esqueci de passar nas claras, fui para a farinha
direto, e só percebi o erro quando as lulinhas já estavam no deep fryer. Pensei: “ferrou mané!”. Daí
quando olhei para o lado, as lulas de Ismat estavam exatamente iguais as
minhas! Perguntei para ela “Girl, você
lembrou de passar as lulas nas claras?”, e ela, com cara de horror “Oh my gosh, esqueci!”. Hahahaha, enfim, lá foi Ismat apresentar o
prato dela. E enquanto eu estava montando o meu, lá veio Ismat de volta, com um
sorrisinho escondido. Então baixinho ela me disse “O chef nem percebeu... hehe”.
Que beleza! Fui apresentar o meu e a mesma coisa, ele nem percebeu! Conclusão:
a clara não faz a menor diferença, e só está lá para complicar a receita. Ah
seus franceses abusados!
Calmar au sel et poivre preparado por mim
Fechada a semana,
depois de tanto peixe, começou a me dar uma crise de abstinência de carne...
Então passei no mercado, comprei uns New York steaks, e fiz um belo bife acebolado! Acompanhado de pommes chateau, só para praticar (afinal está chegando o dia
da prova prática!!!).
Bon Appetit!